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PAULO DE MATTOS SKROMOV: As tensões internacionais nos limites da guerra

PAULO DE MATTOS SKROMOV: As tensões internacionais nos limites da guerra

Transcrição da exposição acerca da caracterização da conjuntura internacional feita por Paulo de Mattos Skromov. Esta foi a primeira de uma série de entrevistas ao canal Emancipação do Trabalho, com o dirigente operário e sindical da luta contra a ditadura e das décadas seguintes. Foi o autor da Carta de Princípios do PT e uma espécie de primeiro presidente nacional do partido, quando esteve na direção do "Movimento por um Partido dos Trabalhadores".

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EMANCIPAÇÃO DO TRABALHO: (00:03) Olá a todos e todas. Estamos dando início a mais uma entrevista especial do canal Emancipação do Trabalho. Hoje, temos a honra de receber o camarada Paulo de Matos, ex-dirigente operário e um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores. Gostaria, sem mais delongas, de começar perguntando como o camarada vê a situação mundial hoje, diante do início de 2025, com a posse de Trump, a situação no Brasil com a extrema-direita se animando a tensionar, e mais ainda, que a própria burguesia e os monopólios aqui instalados estão dispostos a pressionar ao máximo o governo de Lula e tensionar para a volta do fascismo tupiniquim ao poder. E a situação mundial, com uma disputa cada vez mais tensa, que alguns já consideram que estamos vivendo uma terceira guerra mundial entre o bloco da OTAN, do imperialismo no Ocidente, e o bloco de países agrupados em torno dos BRICS, tendo à sua frente a China, a Rússia e o Irã, do qual o Brasil também faz parte. Paulo, é mais uma vez um prazer te receber aqui. Na última vez que conversamos foi em dezembro de 2020, se não me engano, e já faz mais de 4 anos. Fique à vontade para tecer suas considerações. 

PAULO DE MATTOS SKROMOV(01:40): Obrigado pelo convite. É um prazer falar com seus telespectadores e internautas do Emancipação do Trabalho. Bem, é obrigatório começar pela situação internacional, porque ela impacta sempre, mas sobretudo nessa quadra, nesse momento, nessa conjuntura internacional. Não há nenhum recanto do planeta, nenhuma parcela da humanidade que esteja livre de sofrer as consequências, passar pelos riscos e ameaças e tensões da conjuntura internacional. O mundo não tem mais de um império. Esse é o primeiro aspecto. Há um império unipolar, os Estados Unidos da América do Norte, onde a classe dominante, ao final da Guerra em 1945-46, aliada com outros impérios europeus em decadência e com o concurso decisivo e heróico da União Soviética, derrotou a tentativa de um império alemão, no caso, um subimpério italiano e alguns aliados japoneses também com pretensões imperiais de disputar. Foi, nesse sentido, uma guerra interimperialista, tanto quanto já fora a primeira guerra, de 1914 a 18. 

(03:50) Ao terminar a Segunda Guerra, com a ocupação pelo Exército Vermelho da capital Berlim e de toda uma parcela majoritária do território alemão, no mundo ocidental, a potência ascendente era o império norte-americano, a burguesia norte-americana que, afastada do cenário central da guerra, lucrou o quanto pôde com a guerra, entrando mais ao final, sobretudo após a provocação de Pearl Harbor, no enfrentamento à potência asiática da época, que era o Japão. A conjuntura agora tem semelhança no que se refere ao imperialismo, digamos assim, provocador da guerra, estar recorrendo ao fascismo, à cartada do fascismo. Mas eu espero poder explicar em que medida e como ele está recorrendo a essa carta. 

(04:49) A conjuntura, apesar de trazer a ameaça de uma Terceira Guerra Mundial para uns mais próxima, para outros um pouco mais distante, mas de qualquer maneira, já ser essa crise um preâmbulo de uma possibilidade concreta de uma Terceira Guerra Mundial, que no caso seria imprevisível, dadas as condições já atuais do planeta, da única nave habitável não só pela humanidade, mas por todas as espécies vivas da nossa biosfera. Hoje, não há dois ou três imperialismos pretendentes à substituição do imperialismo dominante. É o próprio imperialismo unipolar que acabou de ser ultrapassado. Isso faz, segundo um companheiro que eu avalio que tem muita autoridade na questão geopolítica, que é o Ladislau Dowbor, antigo companheiro da luta contra a ditadura, da luta armada na época, inclusive. Ele tem falado, fornecido análises consistentes, tem um acesso privilegiado a dados sobre o imperialismo, enfim, todas as economias, a China inclusive, em todo o planeta, em cada país. E ele deixa claro isso: desde 2017, a economia chinesa ultrapassou a dos Estados Unidos na questão do poder de compra da sua economia. O erário chinês, o volume de negócios da China, envolve 37 trilhões de dólares, o dos Estados Unidos, o poder de compra é de 29 trilhões. 

(07:53) Agora, não é baseado nesse critério. Esse é o critério do Ladislau. As estatísticas continuam saindo pelo Banco Mundial, enfim, pelo FMI, etc. Mas esse é um dado essencial. Agora, é claro, a China tem 1 bilhão e 400 milhões de habitantes, os Estados Unidos têm 350 milhões de habitantes. Então, a renda per capita é, claro, disparadamente maior nos Estados Unidos. Só que a desigualdade social é também disparadamente maior. Embora hoje existam milionários na indústria e na agropecuária na China, não existe nos bancos na China. É um dado importante para que se avalie que, de qualquer maneira, a reação do império que domina hoje a economia mundial vem um pouco tarde. Talvez tudo dependa da maneira como a China vai reagir nessa conjuntura. 

(08:52) O início do governo Trump mostra que há uma tentativa de intimidação. Não é quer dizer que os Estados Unidos vivem uma situação revolucionária. Não existe ameaça de uma revolução social nos Estados Unidos, apesar de concordar com o Trotsky, que já nos anos 40 dizia que o país mais bem preparado para o socialismo são os Estados Unidos, do ponto de vista objetivo da situação nacional deles, local, da quantidade de trabalhadores. E, de qualquer maneira, esse é um dado importante e fundamental para diferenciar situações que têm algumas similitudes. Por exemplo, 1937-38, ou digamos, se quiser comparar o Trump 2 com 1933, alguns analistas dizem que nós estamos em 1933, comparando com o parâmetro anterior da Segunda Guerra com o fascismo. 

(09:45) Mas é importante também a análise do Norman Finkelstein. Ele alerta para um ponto essencial: o nazifascismo é um espantalho ainda nesse momento. Estamos falando dessa conjuntura. O nazifascismo é um espantalho com o qual os donos do dinheiro do mundo, digamos, o PIB mundial é de 100 trilhões, eles dominam 50 trilhões. Os 10 maiores grupos norte-americanos, portanto, são os donos. E no caso do governo Trump 2, mais claramente do que nunca, não é uma eleição que foi ganha à custa do financiamento direto dessa elite, dessa oligarquia supermilionária norte-americana, quer dizer, sediada ali, referenciada. Não é que ela não tem pátria, mas a base de operação dela é ali, nos Estados Unidos. Ela controla o aparato industrial-militar, e ela precisa. Ela dispensou essa é uma diferença também importante que eu queria remarcar. 

(10:56) Eu falei aqui do final da guerra e ascensão dos norte-americanos diante da decadência, destruição inclusive do imperialismo anterior mais forte, que era o inglês, o britânico, mas também do francês. O país ficou ocupado quase todo o tempo, a partir de 38, pelo nazismo, uma grande parte inclusive, algumas das suas colônias. E ao final da guerra anterior, 45-46, o governante norte-americano, que herdou do Franklin Roosevelt, ele tinha dois ministros fundamentais que discordavam sobre o que fazer com o butim, com a herança dos impérios decadentes, francês, inglês, belga, português. Ele tinha dois ministros. É interessante isso, porque propunham propostas radicalmente opostas. Tinha um ministro chamado Marshall e tinha um ministro, se eu não vou pronunciar corretamente, mas eu li o nome dele como Morgenthau. 

(11:52) O ministro chamado Morgenthau propunha o que nós hoje chamamos de neoliberalismo, isto é, propunha o saque impiedoso e a transformação inclusive dos países sedes imperiais decadentes em colônias agrícolas e, se for o caso, mineradoras, para fornecer matérias-primas agrícolas, no sentido de agricultura. O que fazer com a Alemanha, principalmente? O que fazer com a Turquia? O que fazer com os impérios derrotados? Em primeiro lugar, e depois com os impérios aliados. E a opção do Truman, e não é do Truman, na verdade, desse estado profundo das grandes corporações, dos megafinancistas, decidiu que o risco de uma revolução social naquele momento, inclusive o império alemão havia levantado a questão do fascismo, que na Alemanha chamava-se nazismo, mas é o mesmo recurso que a Itália de Mussolini, de Salazar em Portugal, de Franco na Espanha também usaram para assumir o poder em seus países. 

(12:52) E é interessante isso, porque quem havia concorrido decisivamente para libertar a Itália tinha sido, sobretudo, os partisans, os partidos comunistas e, secundariamente, socialistas, os partidos operários. Tanto que, na montagem do governo pós-Mussolini, para colocar a burguesia numa frente ampla no governo de reconstrução, tiveram que chamar até um general Badoglio, mussoliniano arrependido, supostamente. Agora, no Brasil, sabemos o que é ser bolsonarista arrependido. Era algo assim. Era tão pobre a participação da burguesia italiana na resistência ao fascismo que eles não acharam nenhum líder. Tiveram que recorrer a mussolinianos arrependidos de última hora. 

(13:55) E na França não foi muito diferente. De Gaulle, quando chega, a resistência já estava nas portas de Paris. A resistência era basicamente o Partido Comunista e o Partido Socialista, basicamente. Não é, era a classe operária, eram os trabalhadores que tinham como referência fortíssima a revolução de 17. Era outro momento. Hoje, a classe trabalhadora somente num setor de vanguarda ainda conserva essa referência. Mas na época, os grandes partidos da classe trabalhadora europeia se inspiravam e diretamente mantinham vínculos até enganosos, mas que eles pensavam que seriam com a continuidade da revolução de 1917, a revolução bolchevique. 

(14:54) Então, veja, o imperialismo ali adota, afasta as ideias do Morgenthau e adota as do ministro Marshall, e passam a reconstruir o capitalismo europeu, inclusive nas sedes dos impérios adversários, inimigos durante a guerra. O próprio Japão. O imperialismo percebeu que, logo depois, com a revolução em 1948 na China, e depois o seu alastramento para setores na Coreia, e não é, chamada Indochina, até um trotskista ganhou a prefeitura de Saigon logo depois da guerra. Não sei se você sabe disso, um trotskista chamado Ta Thu Thau, que foi morto pessoalmente por um stalinista sob tortura. Mas isso são coisas antigas e que não interferem hoje, mas são histórias importantes para se conhecer. 

(15:57) Então, diante do risco da revolução, até o Japão foi reconstruído. Até o capitalismo japonês foi reconstruído. Claro, uma ocupação militar ferrenha, uma tomada de países que tinham sido, ainda que por momentos durante a guerra, colônias japonesas, tipo Filipinas e outras ilhas do Pacífico. Então, veja, esse dilema entre arrancar até a pele dos trabalhadores, deixá-los trabalhar numa situação análoga à escravidão, que é o objetivo do liberalismo, mal chamado, né, liberalismo num momento que não há concorrência intercapitalista. Liberalismo é aquela coisa do Smith. Mas enfim, essa é uma outra situação interessante. 

(16:47) O mundo conheceu então, até a década de 70 no pós-guerra, um período de, digamos, avanços, inclusive em, claro, setorialmente, não os países coloniais, mas na Europa. Essa tática do Plano Marshall, do estado de bem-estar social, etc., que interessante, não se adota nos Estados Unidos, porque o risco da revolução lá não se colocava. Também chegou a se esboçar no início da crise de 1930, no início do governo Roosevelt, mas eles haviam já acertado a fusão entre a antiga central pelegra e a nova Central A. Já haviam acertado a domesticação. O Partido Comunista americano proclamava que não havia luta de classes nos Estados Unidos, que era o caso de Gene Debs. Não sei se lembra, o secretário-geral, Earl Browder. O trotskismo não conseguia passar de 3.000 militantes, que era um grande grupo, era o maior da Quarta Internacional. Claro, depois foi superado pelo do Ceilão, da Bolívia, mas porque esses países viviam períodos revolucionários. 

(17:42) Então, é isso que eu queria registrar inicialmente. Agora, há polêmicas. O que significa? Eu estou, não sei se está claro, eu estou dizendo que o Trump 2 não vai fazer um governo fascista, não quer a guerra como primeira opção, mas vai ameaçar o mundo com a barbárie, e já começou. Evidente, começou ao estilo de um bufão. Quem levar a sério, se assustar e ceder, vai se enquadrar. Agora, a complicação é que o Biden fez um monte de besteira, de burrada. Não é errado dizer que foi um dos piores governos, até o Jeffrey Sachs define assim: foi o pior governo que o imperialismo conheceu. Ele fez as três coisas erradas. Ele criou três conflitos agudos, além do conflito com a China, e que ele atacou abertamente. Austrália, Japão, Coreia do Sul e outros, Filipinas, também tem bolsonarismo, um Trumpismo bolsonarismo, digamos lá nas Filipinas. Além de regimentar esses para uma frente, inclusive não apenas política, militar, para cercar a China, ainda iniciando um processo que ele já tinha avançado muito em relação à Rússia. 

(18:45) Ele cria uma segunda frente, não apenas o Biden, mas desde Obama já começa a criar uma segunda frente. Já vem de lá de 2014, quando eles derrubam o governo burocrata do PC ucraniano, que o estado soviético local já vinha em processo de criar uma provocação no sentido de submeter, cercar militarmente e com armas nucleares o território russo. E uma coisa surpreendente é que, com toda a decadência que foi o pós-União Soviética na Rússia, é que parece ter se mantido também, em alguma medida, um estado profundo em relação a algumas coisas estratégicas, sobretudo a questão bélica. 

(19:45) E o não rompimento, com orgulho, dos feitos da Guerra Patriótica, dos feitos de estarem, digamos, mais do que os de Vichy, lá não se derrubaram as estátuas da revolução. Simplesmente, os burocratas mais espertos tornaram-se proprietários das empresas que eles administravam em nome do estado operário deformado e restaurado naquela União Soviética em 1991, no momento do colapso. Aquele país surgido, Rússia, a Federação Russa, a Rússia mais alguns países que resolveram se manter coligados sob o mesmo estado. E eles cometem uma série de erros. E a reconstrução da burguesia foi de um caráter, digamos, mafioso, criminoso. Não é uma guerra pela posse das antigas estatais, pela criação de novas, enfim, pelas reservas riquíssimas minerais, estratégicas, não é só petróleo, gás, mas minerais novos que hoje são fundamentais para esses avanços de ponta da ciência, comunicações, inclusive. 

(20:40) Bom, enfim, é surpreendente o reconhecimento do que significou Putin na reconstrução, ainda que debaixo do capitalismo restabelecido, com características como eu disse inicialmente, mafiosas, que vão se legitimando, que vão se acertando em regras internas entre os novos proprietários dos meios de produção, dos exploradores do trabalho alheio. Enfim, esse é o segundo grande ponto. 

(21:33) Agora, voltando ao segundo erro, essa segunda frente na Ucrânia, uma guerra civil dolorida, porque imagina um cara que nem eu, vou torcer para quem? Para a Ucrânia? Para a Rússia? Que sou descendente de avós e até do meu pai, que na verdade nasceu na Lituânia. Ele era um soldado, meu avô era um soldado da cavalaria do czar. Meu pai nasceu na Lituânia, mas ele nunca disse que ele era lituano. Ele era russo. Minha avó nasceu na Ucrânia, mas ela nunca disse que era ucraniana. Não havia isso, não havia esse hábito. Era culturalmente correto dizer "russo". A língua era russa. Ela conhecia o dialeto do leste, do oeste, ucraniano, outros dialetos, mas a língua materna era russa. 

(22:33) Então, se deram mal lá. Agora, você sabe, a guerra está praticamente nos seus estertores. E se o Trump tiver falando com mínimo de seriedade, ele não está dando mais dinheiro para os Zelensky. Ele está dizendo que 3% para cada país europeu financiar os Zelensky, que é pouco. Ele está querendo que seja pelo menos sim, para prosseguir. Então, essa segunda frente que não tem futuro. A segunda, a terceira frente é do Oriente Médio. Olha que também começou lá atrás. O Obama ganhou o prêmio Nobel da Paz. Lembra? Estava assumindo e ganhando o prêmio Nobel da Paz e se tornou, digamos, os oito anos dele não necessariamente ele decidiu, porque não é o presidente que decide, né, é o estado profundo dos financistas nos Estados Unidos que decidem o que o império vai fazer, deixar de fazer. 

(23:36) Tanto que o Biden, o Biden passou dos 4 anos. Talvez não tenha governado lucidamente nem o primeiro ano. Descobriram que ele estava senil. Ele virou candidato, teve que fazer campanha e não conseguia fazer campanha. Então, quem tocou o governo Biden foi essa equipe de assessores, né, especialistas. Mas enfim, o terceiro erro é o Oriente Médio, é Israel, a parceria com Israel para criar uma, digamos, uma ponta de lança da OTAN. Já eles vinham tentando transformar a Turquia, negociando a sua aceitação, entre aspas, como membro da União Europeia, com a entrada na OTAN. Ela esboça que vai completar esse processo e, de repente, ela cai fora e hoje está se aproximando dos BRICS. 

(24:41) Me parece que até tem novidades a respeito de uma formalização como membro mais pleno. De qualquer maneira, a Hungria dificilmente vai cumprir um papel hoje que os Estados Unidos conferem à OTAN, não é, tanto na questão de atacar a Rússia e dominar e transformá-la numa colônia de exploração, como de dominar o Oriente Médio. Então, me parece também que você viu, eles viram essa tomada da Síria, essa derrubada do Assad com muita alegria, e de repente já não estão tão felizes assim, porque a Turquia já não é tão confiável. 

(25:41) E de repente, os cortadores de pescoço radicais, fundamentalistas da Síria não começaram a cortar pescoços ainda e estão achando muito estranho o que está acontecendo. E agora parece que a Rússia está firmando um impacto também não tão profundo quanto fez com o Irã recentemente, na véspera da posse do Trump 2, mas parece que está caminhando para isso com a Turquia. E de qualquer maneira, o plano de erradicar, fazer a limpeza étnica, quer dizer, que eles mandam parar a guerra, porque a guerra do Oriente Médio, principalmente esse massacre, esse genocídio em Gaza, foi erodindo a própria Europa. 

(26:47) Qual é o povo que hoje apoia o sionismo na Europa? Não dá para dizer que a Inglaterra, com manifestações que chegaram até 1 milhão de pessoas, esteja apoiando. A extrema-direita, o fascismo apoia, mas até certo ponto, porque eles entendem que é uma questão tática. Mas o nazismo nunca vai apoiar 100% nenhuma das causas, por mais distorcida que seja, do judaísmo. A questão do Oriente Médio então foi um desastre. Na própria questão asiática, onde a população australiana, por exemplo, foi uma das que mais se manifestou a favor dos palestinos. A Irlanda, que é a menina dos olhos, onde se investiu, essa turma dos maiores capitalistas americanos transformou a Irlanda numa coqueluche do capitalismo europeu. O povo irlandês, e até os políticos, o parlamento irlandês é dominado esmagadoramente por pró-palestinos. 

(27:52) Quer dizer, veja, a Europa, França, com a presença árabe tão forte hoje, perfeitamente legitimada como parte do povo francês. Não adianta Le Pen pretender uma limpeza étnica da França, que é um negócio completamente absurdo nessa altura. Quem é a maioria na França? Os gauleses ou os árabes? Nesse momento, é um negócio maluco. Os africanos, enfim, é a própria Alemanha. Viu quando o Elon Musk, o dono do X, o homem mais rico do mundo, faz a suástica, faz o gesto hitlerista na posse, na inauguração? A repercussão, e depois ele fala uma besteira sobre as eleições alemãs que estão chegando. Aí ele fala que vai apoiar o partido fascista. A reação da população alemã, olha, manifestações multitudinárias impressionantes, que não se via na Alemanha desde a época de 67, que foram aquelas manifestações dos estudantes que chegavam a atacar as bases americanas na Alemanha ocidental. 

(28:45) Aliás, uma referência dos líderes estudantis europeus daquela época, para mim, a grande referência foi o Rudi Dutschke, não sei se lembra, um cara que atiraram na cabeça dele, ele virou um vegetal e foi tirado da luta. Era um alemão oriental expulso da Alemanha oriental e perseguido na Alemanha ocidental e mal visto na Alemanha oriental porque começou a rebelar a partir das universidades a juventude. E ele era da Juventude do Partido Operário Social-Democrata Alemão, quer dizer, o que restara, era o nome, pouco mais que isso. Mas para ter uma ideia, nós estamos falando de reabilitar o PT, pelo menos fazer a luta para isso. 

(29:43) É interessante que, como alguns partidos dados como completamente perdidos, às vezes jogam algum papel nesse momento. Não há dúvida que o que acordou, o que despertou essas milhões de pessoas a saírem às ruas na Alemanha nesses dias, certamente essa velha tradição que vem lá de precursores como August Bebel, Lassalle, Kautsky, que tiveram seus bons momentos, nem sempre jogaram contra a classe trabalhadora, alguns até o final jogaram a favor. Então, é isso. 

(30:38) No Oriente Médio, o desastre não é menor. Veja bem, os palestinos, nesse momento, têm um respaldo de países que os americanos não suspeitavam. Veja esses dias mesmo, a Jordânia, uma monarquia entre nós fajuta, deixada pelos ingleses, igual à Saudita, igual aos militares egípcios agora, que são financiados pelo erário norte-americano ainda, não estão favoráveis à limpeza étnica proposta pelo Trump na Palestina. Ele manda parar a guerra porque é um desastre continuar aquele massacre, que não era guerra, o genocídio foi desastroso do ponto de vista do resto do mundo. Claro que foi desastroso para os palestinos, foi um negócio horror televisionado, filmado, documentado diariamente, a cada minuto, uma vergonha para a espécie humana. 

(31:37) Mas é um fracasso. Israel, quer dizer, veja, a destruição da Líbia, a invasão do Iraque já com Bush, tudo foi muito. Eles saíram derrotados no Afeganistão, saíram corridos, deixaram no lugar quem? Aqueles que eram os seus adversários, que foram pretexto da sua invasão no país. Então, é um fracasso nas três grandes áreas de tensão. Claro, tem outras tensões, mas essas três áreas de tensão, o imperialismo norte-americano criou na sua belicosidade. 

(32:36) E isso é um dado também que é importante. Muita gente às vezes não analisa como eles têm o domínio das comunicações, da propaganda no mundo. Pode ser que alguns que estão nos ouvindo não têm essa informação. Mas qual é o único país que usou bomba nuclear contra outro país? Os Estados Unidos da América do Norte. Qual é o país que mais fomentou guerra? Quantas guerras a China fomentou? Não é, pelo contrário, ela chegou até a intervir contra algumas revoluções. O caso quando o Vietnã expulsou os Estados Unidos, 300.000 soldados chineses invadiram, tentaram tomar Hanói. Eu, por exemplo, fiquei assustadíssimo quando soube. 

(33:29) E meus companheiros que moravam em Santiago do Chile, dia 11 de setembro de 73, quando buscavam a embaixada chinesa, imaginando que ia dar acolhida aos perseguidos pelo fascismo, pelo Pinochet, que era morte. Cair na mão do Pinochet era morte. Certo, até hoje não se sabe quantos milhares foram enterrados lá em Atacama. Quer dizer, nem os corpos. E a embaixada chinesa devolvia para a polícia do Pinochet os refugiados que buscavam, imaginando que era uma embaixada de esquerda, que era contra o golpe, que era a favor do Allende, a favor da revolução. 

(34:15) Então, quer dizer, é até surpreendente um debate que cabe aqui colocar. Estamos falando da conjuntura internacional porque esse é um dado fundamental. Um companheiro importante, uma tendência importante do PT está discutindo o caráter do estado chinês. Para mim, era uma coisa tranquila, era um capitalismo reconstruído, digamos, claro, de maneira diferente do capitalismo russo reconstruído, herdado pelo Putin. Mas de fato, tem, estranhamente, características formais. Partido Comunista, uns 100, 110 milhões, quer dizer, vamos dizer assim, nem 10% da população afiliada como partido dominante. 

(35:04) Que se saiba, o nível de repressão hoje não é grande, é como qualquer estado, digamos, nacional, e portanto, não estou dizendo que não é uma ditadura, mas é uma revolução que surge no momento que é o auge do stalinismo, quando está colhendo os frutos da vitória na Segunda Guerra e do prestígio. Falar nisso, também, acabei um preâmbulo aqui. O Parlamento Europeu, ridiculamente, acaba de tirar uma decisão de proibir, claro que as leis dele têm que ser referendadas em cada país europeu membro da União, acaba de proibir o uso de símbolos nazistas. Nazistas, devia falar fascistas, porque o genérico nazista é o fascismo alemão, e comunistas. Proibiram o uso de símbolos comunistas. 

(35:57) Imagine como é que fica em alguns países, os partidos comunistas ainda têm uma importância, inclusive eleitoral, ainda têm bancadas, talvez no próprio Parlamento Europeu deve ter bancada de comunistas. Imagine você falar isso na Europa que foi libertada do nazismo pelos então chamados comunistas, que ainda viviam sob um regime criado pelos comunistas. Parlamento ridículo esse, europeu, que é um fracasso. Quer dizer, a União Europeia, concebida com esses objetivos, por causa da OTAN, por causa do alinhamento absurdo, submisso, acaba de se autodestruir. 

(36:45) Eu não estou falando dessa frente que é a Europa, porque ela está envolvida diretamente na frente que eu mencionei, que é a Ucrânia. Mas ela está envolvida também na frente contra o Oriente Médio. A Líbia foi destruída por bombardeiros inclusive da Marinha espanhola. Imagine, a Espanha, que agora o próprio governo socialista do Partido Socialista, não socialista necessariamente, se pronunciou contra o genocídio, a favor da cessação da barbárie, do massacre. Então, esses são os aspectos. 

(37:40) Agora, para encerrar, para que sirva de referência para nós aqui na conjuntura nossa, é fundamental isso. Então, veja, há muitas etapas a serem queimadas. A China, como eu mencionei aqui, houve alguns momentos que ela teve um alinhamento complicadíssimo. Essa mesma invasão do Vietnã do Norte, logo depois eles puseram os americanos para fugir de Saigon. Esse episódio do apoio ao golpe do Pinochet, etc., são importantes. Agora, terá ela superado essa subserviência? Porque ela era, veja, eu estou quem está falando para você é um cara que sabe. 

(38:30) Por que eu me aposentei? Aceitei a proposta do governo de aposentar quem era anistiado político porque a minha filha foi embora para a China. Ciro Gomes era o ministro, 7 de setembro de 94, substituindo o FHC porque ele tinha se tornado candidato para encarar o Lula, que parecia imbatível depois de ter enfrentado e o caçador de marajás, o Collor, e enfrentado a quadrilha do PC paulista, enfim, com tudo aquilo já revelado, e depois ainda capitaneando a campanha das Diretas, do impeachment do Collor, que foi também uma campanha de multidões de milhões de pessoas. 

(39:18) Quer dizer, Lula parecia imbatível, mas o FHC já então se alinhando com o neoliberalismo completamente, e o PT já domesticando a CUT num processo de filiação à social-democracia europeia já naquele momento completamente degenerado, e forjando a introdução do sindicalismo não mais classista, mas apenas intercorporativo, vertical, em vez de horizontal, contra a burocracia, e agora tornando-se também burocracia. 

(40:17) Naquele momento, é importante então acentuar essas questões da situação internacional que vão depois informar como vamos, quais são as expectativas, quais são as possibilidades aqui no Brasil, em relação às pressões que virão. O Brasil hoje, interessante isso, é bom registrar porque isso faz parte da internacional, mas é dado que joga também para a conjuntura local. O Brasil, presidente dos BRICS, justamente no momento da posse. O Brasil renovado na presidência do banco dos BRICS. 

(41:12) Quer dizer, você percebe que a China faz o movimento de não mais vacilar diante do imperialismo. Eu tinha citado vacilações antigas, algum atraso que eu citei muito antigo, mas há algumas que nós podemos chamar de enfrentamento, porque o Biden, não é o Trump 2 que está começando com sanções, já havia sanções no Trump 1, e houve um aumento de sanções contra a China no Biden, nos 4 anos do Biden. 

(42:02) Então, veja, a China já está desde que ela ultrapassou em 2017 como maior economia com capacidade de compra do planeta, ela tem sido hostilizada na questão da economia. O Trump 2 vai ultrapassar o limite da política da pressão econômica, da pressão política, da ameaça de guerra, e não a guerra concretizada. Quer dizer, as guerras que eles estão prometendo e que estavam assustando, e assustavam sobretudo porque eles, o estrago que eles estão conseguindo fazer com as tais big techs que eles dominam completamente. 

(42:49) A China acaba de mostrar que ela pode criar e já criou uma big tech alternativa. Nós seremos obrigados a aceitar o Musk, o cara do Facebook, e os outros barões superbarões aí das comunicações mundiais, atuando, espalhando fakes. Imagine, o Musk tem investimentos na China muito grandes. Como é que ele pode arriscar-se? 

(43:39) Então, eu acho que tem muita papagaiada também que faz parte daquele cara que é o apresentador de televisão que é o Trump. Quer dizer, ele escolheu um secretariado folclórico. O cara que vai cuidar da CIA é um daqueles descendentes de cubanos lá de Miami. Imagine o cara que vai cuidar. Mas será que vai? Será que o estado profundo, será que os interesses? 

(44:32) Veja, a China também, suas reservas estão imensamente quase todas nas mãos dos bancos suíços, americanos, ingleses, franceses, enfim. Do jeito que os americanos andaram usando o dólar para confiscar as reservas russas como parte do processo antes

(44:32) Países que os americanos não suspeitavam... Veja, esses dias mesmo, a Jordânia, uma monarquia fajuta deixada pelos ingleses, igual à Arábia Saudita, igual aos militares egípcios, que ainda são financiados pelo erário norte-americano, não estão favoráveis à limpeza étnica proposta pelo Trump na Palestina. Ele manda parar a guerra porque é um desastre continuar aquele massacre, que, na verdade, não era uma guerra, e sim um genocídio desastroso do ponto de vista do resto do mundo. Claro que foi desastroso para os palestinos, não é? Foi...

(45:27) Um horror televisionado, filmado, documentado diariamente, a cada minuto. Uma vergonha para a espécie humana. Mas é um fracasso, não é? Israel... Veja a destruição da Líbia, a invasão do Iraque... Tudo foi um desastre. Eles saíram derrotados no Afeganistão, saíram correndo, deixando no lugar justamente aqueles que eram seus adversários e que serviram de pretexto para a invasão do país. Então, é um fracasso nas três grandes frentes. Claro, há outras tensões, mas essas três áreas de tensão foram criadas pelo imperialismo norte-americano em sua belicosidade.

(46:28) Isso é um dado importante, mas que muita gente, às vezes, não analisa. Como eles têm o domínio das comunicações e da propaganda no mundo, pode ser que alguns que estão nos ouvindo não tenham essa informação. Mas qual é o único país que usou uma bomba nuclear contra outro país? Os Estados Unidos da América do Norte. Qual é o país que mais fomentou guerras? Quantas guerras a China fomentou? Pelo contrário, ela chegou até a intervir contra algumas revoluções. Por exemplo, quando o Vietnã expulsou os Estados Unidos, 300.000 soldados chineses invadiram e tentaram tomar Hanói.

(47:16) Eu, por exemplo, fiquei assustadíssima quando soube, assim como meus companheiros que moravam em Santiago do Chile, no dia 11 de setembro de 1973. Eles buscaram a embaixada chinesa, imaginando que ela daria acolhida aos perseguidos pelo fascismo de Pinochet, pois cair nas mãos de Pinochet era morte certa. Até hoje, não se sabe quantos milhares foram enterrados em Atacama, ou seja, nem os corpos foram encontrados. E a embaixada chinesa devolvia para a polícia de Pinochet os refugiados que a buscavam, imaginando que era uma embaixada de esquerda, contra o golpe e a favor de Allende e da revolução.

(48:07) Então, é até surpreendente. Esse é um debate que cabe aqui, pois estamos falando da cultura internacional. Esse é um dado fundamental. Um companheiro importante, uma tendência importante do PSOL, está discutindo o caráter do Estado chinês. Para mim, era algo tranquilo: um capitalismo reconstruído, claro, de maneira diferente do capitalismo russo herdado por Putin. Mas, de fato, estranhamente, tem características formais: um Partido Comunista com uns 100, 110 milhões de afiliados, ou seja, nem 10% da população faz parte do partido dominante. O nível de repressão hoje não é grande, é como o de qualquer Estado nacional. Portanto, não estou dizendo que não é uma ditadura, mas é uma revolução que surgiu no auge do stalinismo, colhendo os frutos da vitória na Segunda Guerra Mundial e do prestígio.

(49:56) A propósito, cabe um comentário aqui: o Parlamento Europeu, ridiculamente, acaba de tomar a decisão de proibir o uso de símbolos nazistas e comunistas. Claro que as leis precisam ser referendadas por cada país-membro da União Europeia, mas imagine isso: em alguns países, partidos comunistas ainda têm importância eleitoral e bancadas parlamentares. Como explicar essa proibição na Europa, que foi libertada do nazismo pelos então chamados comunistas? Esse Parlamento Europeu é ridículo. A União Europeia, concebida com certos objetivos, hoje se autodestrói por causa da OTAN e de um alinhamento absurdo e submisso.

(51:33) A Europa está envolvida diretamente na frente da Ucrânia e na frente do Oriente Médio. A Líbia foi destruída por bombardeiros, inclusive da Marinha espanhola. Imagine! A Espanha, cujo governo socialista se pronunciou contra o genocídio e a favor do fim do massacre...

(55:11) O Brasil hoje preside os BRICS justamente no momento da posse. Você percebe que a China está se movimentando para não mais vacilar diante do imperialismo. Eu citei vacilações antigas, mas há algumas que podemos chamar de enfrentamento. Biden não é Trump. No governo Trump 2, que já começou com sanções, veremos um aumento da pressão contra a China. Desde 2017, quando ultrapassou os EUA como maior economia em capacidade de compra, a China tem sido hostilizada. O Trump 2 promete ultrapassar os limites da guerra econômica e política, mas sem concretizar a guerra militar.

(1:01:01) Os Estados Unidos ainda são o poder econômico dominante, mas a China está escondendo o jogo na questão militar. Ela já tem um acordo de longo prazo com a Rússia para troca de tecnologia. Seus avanços tecnológicos certamente serão compartilhados com seus aliados.

(1:08:08) O Chile teve uma mobilização fantástica e corajosa em plena pandemia, milhões exigindo o fim do neoliberalismo. No entanto, o processo da constituinte levou a um esvaziamento e a uma inversão. O Partido Comunista chileno está alinhado aos EUA.

(1:09:57) Espero que a reunião da CELAC, que deve acontecer nos próximos dias, tenha um espírito de autonomia. Se o Lula conseguir manter uma política externa minimamente altiva, ele contará com aliados como Petro, Maduro e a presidente do México.

(1:12:47) O Trump já anunciou sua saída do Acordo de Paris. Negacionismo dentro dos EUA tem consequências. O meio científico norte-americano é de excelente qualidade, mas como reagirá?

EMANCIPAÇÃO DO TRABALHO: (1:15:25) Muito obrigado, camarada. Foi um panorama elucidativo da sua interpretação sobre a conjuntura internacional. Vamos continuar essa conversa com outros temas.

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